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Post Info TOPIC: Favelas, como proceder?
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Favelas, como proceder?
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Sabemos que a periferia das grandes cidades brasileiras estão abarrotadas de favelas, só no Rio de Janeiro, aonde eu moro, são 1,5 milhões de pessoas morando em favelas


Quais seriam as propostas liberais para a erradicação das favelas? Programas governamentais de construção de habitações populares podem ser considerados? Qual seria o papel da iniciativa privada?


 


 



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Caro Anônimo,


o problema das favelas tem várias origens, e a pobreza, embora naturalmente a mais importante, nao é a única. Nenhuma solucao que nao atacar as causas será definitiva.

O que caracteriza uma favela como tal (especialmente no Rio, mas também em SP ou em qualquer outro lugar)? Podemos dizer que é o seguinte:

1) Condicoes precárias de moradia (barracos improvisados, esgoto a céu aberto, ocupacao caótica do espaco, etc);
2) Ausência do Estado nas suas funcoes fundamentais (servicos públicos precários, seguranca pública praticamente inexistente, etc);
3) Populacao de baixíssima renda e frequentemente sub-empregada (falta de espaco na economia formal);
4) Direitos de propriedade precários (as favelas sao frequentemente construídas em terrenos públicos ou privados que estao sem uso, e os habitantes nao tem nenhum título legal de propriedade do lugar em que vivem. Isso significa que eles têm dificuldades para comprar ou vender suas casas, obter financiamentos para construcao, e têm poucos incentivos para melhorar suas moradias; afinal, eles correm sempre o risco de serem expulsos a qualquer momento).

Essas quatro condicoes interagem entre si e tornam difícil uma solucao única. Pode-se resolver a situacao da moradia precária, por exemplo, mas se a renda continuar baixíssima, o Estado prosseguir ausente, e o direito de propriedade permanecer frágil, em pouco tempo essas novas moradias estarao deterioradas e as condicoes de vida voltam a decair (é mais caro manter uma casa de alvenaria do que um barraco).

Entao, grosso modo, eu diria que uma abordagem liberal para o tema (nao é unca possível, mas a que eu, particularmente, consideraria mais adequada) é a seguinte:

1) Estabelecimento efetivo do Estado no ambiente das favelas. Isso significa sim desalojar o tráfico, colocar delegacias de polícia, correio, saúde pública, escolas dentro da favela. A favela têm que deixar de ser governada por um Estado paralelo criminoso. Isso envolve nao apenas a repressao ao crime, mas principalmente a conquista do apoio das organizacoes e grupos sociais dentro da favela, de modo a legitimar a acao do Estado. Uma das formas de fazer isso seria ganhar o apoio dos empreendedores legais dentro da favela (lojistas, empreiteiros, enfim, as pessoas que têm pequenos negócios dentro da favela e que podem servir de núcleo econômico alternativo ao tráfico).

2) Reconhecimento de direitos de propriedade. Os moradores das favelas receberiam titulos de propriedade dos terrenos em que moram, legalmente reconhecidos, gratuitamente.

3) Estímulo à acao coletiva dos moradores. Com o restabelecimento da ordem pública e o reconhecimento da propriedade, os moradores poderiam formar cooperativas de crédito para financiar a gradual substituicao dos barracos por casas de alvenaria. Isso é estimular algo que já acontece, por exemplo, em Sao Paulo, onde favelas inteiras, nas últimas duas décadas, deixaram de ser aglomerados de barracos e viraram pequenos bairros de baixa renda com casas de alvenaria. Essas cooperativas de crédito poderiam também estimular a abertura de pequenos negócios e empreendimentos domésticos para ampliar a renda. O Estado pode auxiliar provendo suporte técnico e orientacao. Modelos de microdredito (que poderiam ser fornecidos por bancos privados) sao interessantes aqui.

4) Gradual inclusao da favela nas redes de servicos públicos. À medida que a favela fosse reurbanizada, seria incluída nos sistemas de água, esgoto, eletricidade, transporte público e telefonia de forma mais regular.

Obviamente, a melhoria da renda e da qualidade do emprego escapam da acao ao nível local de que estou falando, fazendo parte de um processo de desenvolvimento nacional. O aumento da renda levaria naturalmente a uma diminuicao das favelas.


Grande abraco,

Luiz Simi.

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Luis, parabéns. Vc sintetizou muito bem as causas, mas uma de suas soluções, acredito que só seria possível num mundo cor-de-rosa. Vejamos o por quê.


 


1) é disso que estou falando.


O estado paralelo das favelas é fixo, não tem jeito. Os moradores confiam mais no traficante, que cresceu ao lado deles, do que na polícia, que sobe o morro para pegar propina. Uma ação do estado que visasse destituir esse estado paralelo, não contaria com o apoio dos moradores. Seria uma guerra civil sangrenta, uma carnificina, onde inocentes moradores da favela seriam coagidos a fazer parte da força de resistência contra o estado.


Não se iludam. Quando a polícia ocupa a favela, os traficantes preferem não reagir, pois sabem que é provisório, e eles não ganhariam nada em um confronto com uma polícia bem treinada. Eles se escondem, mudam de lugar, mas após a ocupação, eles voltam ao mais perfeito domínio da comunidade.


Posto isso, consideremos que fosse viável essa destituição do estado paralelo das favelas.


Para onde iria o tráfico? Iria acabar? Certamente que não, usuários de droga encontrariam facilmente uma alternativa, e focos de tráfico de droga ficariam dispersos em todos os lugares, não iria acabar. Faz parte da natureza humana, é um vício que pessoas de diferentes níveis intelectuais acabam caindo.


Erga seu sabre e vamos ao duelo, Luis!


 


Grande abraço.



-- Edited by Andres Segovia at 19:50, 2005-10-02

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Caro André,

de sabre em riste, respondo ao seu argumento!

A sua análise está correta quando pensamos dentro da lógica que vemos hoje de relacao entre o Estado e a favela: uma relacao que é basicamente de conflito, em que a presenca do Estado é equivalente a uma ocupacao militar por forca estrangeira. Isso ocorre justamente porque, como você colocou, nao existe uma relacao de confianca entre a populacao da favela e os agentes do Estado. Isso permanecerá assim enquanto nao mudar o formato da relacao que o Estado estabelece com a favela.

É justamente por isso que eu defendo o estabelecimento de uma outra lógica de relacionamento entre Estado e favela. Como escrevi no meu post anterior:

"Isso envolve nao apenas a repressao ao crime, mas principalmente a conquista do apoio das organizacoes e grupos sociais dentro da favela, de modo a legitimar a acao do Estado. Uma das formas de fazer isso seria ganhar o apoio dos empreendedores legais dentro da favela (lojistas, empreiteiros, enfim, as pessoas que têm pequenos negócios dentro da favela e que podem servir de núcleo econômico alternativo ao tráfico)"

Nao sei se esse caminho exato que sugeri é o melhor; acredito que isso vai depender de cada localidade. O estado paralelo do tráfico domina a favela nao porque necessáriamente conte com a confianca dos moradores, mas porque provê servicos que o Estado deveria prover, e emprego. Nao existe nenhuma forma do Estado ganhar espaco na favela se nao for oferecendo alternativas aos servicos providos pelo tráfico, e também ajudar a gerar alternativas de emprego. Isso atingiria a base do poder do tráfico na favela, abrindo espaco para substituir o padrao de ocupacao militar de território estrangeiro que hoje pauta a acao estatal por uma efetiva incorporacao da favela ao cenário urbano governado pelo Estado de Direito.

Ademais, nao podemos esquecer que nem todas as favelas sao controladas pelo tráfico ou pelo crime organizado (isso é verdade, por exemplo, em Sao Paulo). Nas favelas em que o tráfico nao é uma forca tao poderosa, seria possível levar adiante o modelo que sugeri com menos dificuldades e mais rapidamente.

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Luiz,


agora compreendo melhor seu ponto de vista.


Mas penso que o estado paralelo que vigora em algumas favelas já está tão enraizado, está tão seguro do seu domínio, que virou o fulcro de algumas comunidades. Os mentores desse tipo de organização, criaram, talvez de forma até inconsciente, uma relação de dependência profunda.


Essa solução que vc sugere que o estado de direito ofereça, me parece muito distante, pois o estado não têm condições de oferecer isso nem para regiões pobres e que não são favelas. Não vejo alternativas a curto prazo para se implementar um programa de inclusão em massa ao mercado de trabalho.


Sendo assim, só restariam alternativas de longo prazo para essa solução que vc cita, e que, também considero ideal.


Mas vejamos: enquanto o estado de direito estaria lutando para construir, o estado paralelo que, caso não seja desmembrado de uma só vez, continuará ativo, ainda que fragmentado, lutará para minar qualquer tentativa por parte do estado de direito.


Consideremos que o estado paralelo já possui alguns trunfos infiltrados no estado de direito, juízes, políticos, etc, e temos que admitir que será uma batalha estratégica que muito provavelmente obrigará o estado de direito a recuar.


Não quero fazer apologia a nada, mas acho que é uma situação quase irreversível, que poderá apenas ser controlada a distância.


Grande abraço.



-- Edited by Andres Segovia at 19:44, 2005-10-03

-- Edited by Andres Segovia at 19:48, 2005-10-03

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André,


qualquer solucao desse tipo é por definicao uma acao de longo prazo. No curto prazo, simplesmente nao há solucao mesmo. O Estado ficou tempo demais longe dessas áreas para poder, de uma hora para a outra, reassumir o controle delas e estabelecer condicoes mínimas para o Império da Lei.


Mas isso nao torna a dissolucao do Estado paralelo nas favelas impossível. Nada é. O Estado, se decidido a fazê-lo, conta com recursos mais do que suficientes para a tarefa. Ela pode incitar reacao do crime, mas eu particularmente duvido, especialmente se as fontes de suporte local tiverem sido drenadas ou de alguma forma neutralizadas. Os caras vao simplesmente juntar as tralhas e mudar para algum outro canto. Porque? Por que guerra com o Estado é ruim para os negócios.


Claro, para implementar uma solucao dessas, é necessário primeiro reformar o Estado. Mas a questao era: qual seria a solucao liberal para o tema? minha proposta é a que apresentei aqui. A efetivacao dela depende de condicoes que, obviamente, nao existem e nao estao no horizonte. Infelizmente. Mas eu acho importante tentar discutir solucoes de cunho liberal para esse tipo de problema, porque só assim poderemos, com o tempo, oferecer alternativas reais às que existem hoje.


Grande abraco,


Luiz.



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Entendo seu ponto de vista Luiz, e repito, também considero ideal.


 


Grande abraço.



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A postagem acima é minha, só esqueci de me logar. :P

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Curiosamente, o tema da nossa pequena discussao apareceu em um artigo do Paulo Guedes publicado hoje no "O Globo". E segue na linha do que eu propus. O grifo é meu:


"Criando riqueza nas favelas

Um economista de boa estirpe acadêmica examina as favelas da Zona Sul do Rio de Janeiro com uma visão diferente da perspectiva política tradicional.

Em um extremo, evocando-se Carlos Lacerda, defende-se a remoção. As favelas teriam se tornado quartéis-generais do crime organizado, de onde traficantes fortemente armados, desafiando o Estado e desmoralizando a polícia, comandam as centrais de distribuição de drogas para a Zona Sul. Uma intervenção econômica inadequada — proibição do jogo do bicho quando o governo explora loterias numéricas, esportivas e agora permite os bingos — transformou redes privadas de distribuição de apostas em redes de distribuição de drogas.

Em outro extremo, evocando-se Leonel Brizola, ironicamente, defende-se o laissez faire urbano, a ocupação descontrolada dos morros em nome da eqüidade e da democratização da propriedade urbana bem localizada. As favelas teriam tornado a Zona Sul e suas praias um espaço democrático de convivência social.

Como um liberal-democrata do século XXI (no sentido político, de profundo respeito por desafortunados que os mercados deixam para trás), é impossível apoiar a pura e simples remoção das favelas, com centenas de milhares de pessoas que trabalham na Zona Sul sendo transferidas para guetos no outro extremo da cidade. Mas como um liberal no sentido clássico do século XVIII (no sentido econômico, de profundo respeito pelas virtudes das economias de mercado), torna-se também intolerável assistir ao atual processo de destruição de riqueza nas favelas, além naturalmente dos problemas das drogas, da criminalidade e da agressão estética ao meio ambiente causada pela verticalização das favelas por meio de construções não autorizadas.

Um bom economista, que pensa em eficiência, potencialização de riqueza econômica e arrecadação municipal, para financiar escolas e hospitais, olha para o Vidigal e a Rocinha sonhando com pelo menos 10% do IPTU de Positano e da costa amalfitana, na Itália.

A ocupação ilegal precisa ser interrompida imediatamente. Trata-se de um aprofundamento do programa Favela-Bairro. Com a concessão de títulos de propriedade aos atuais ocupantes, teremos simultaneamente um censo (com potencial identificação de associados aos traficantes) e uma política de redistribuição de riqueza (pela atribuição de ganhos de capitais futuros relativos às propriedades).

Estabelecidas as normas legais para as construções, com gabaritos que garantam a segurança das habitações, a implantação da rede de esgoto e a normalização das redes de água e luz resolveriam o problema ambiental e de saúde pública, permitindo a cobrança das respectivas taxas. A próxima fase para garantir a valorização das propriedades privadas é levar o transporte coletivo para o alto dos morros, por exemplo com a construção de um sistema de planos inclinados.

Com as melhorias, o município começaria a cobrar um IPTU simbólico, que subiria ao longo de 20 anos. Os atuais moradores que quisessem vender sua propriedade teriam multiplicado seu valor. Aos demais se juntariam intelectuais, profissionais de nível superior, artistas, estudantes que desejassem morar em bairros charmosos, providos de infra-estrutura e vista para o mar."



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